segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

O Sambódromo e a Lei ILEGAL...

O Sambódromo e a Lei

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/49/Samb%C3%B3dromo.jpgJorge Béja
A construção, na outrora Rua Marquês de Sapucaí, do que se resolveu intitular de sambódromo ou passarela do samba se constitui numa ilegalidade que perdura desde o 1º governo de Leonel Brizola (1983-1987). E a cobrança de ingresso para que o povo assista aos eventos que lá ocorrem é mais ilegal ainda.
Diga-se, antes de mais nada, que a obra tem forte conotação de semelhança com a obra de Vespasiano na Roma antiga. O Coliseu, que com capacidade também para pouco menos de 100 mil pessoas, surgiu com a finalidade principal de servir de circo, trágico circo para o deleite dos pagãos a verem o sacrifício dos cristãos. E serviu, também e principalmente, para perpetuar o nome do Imperador que a iniciou e que tinha, também, a fama de ser um governante notoriamente aumentador de impostos e taxas. A diferença no tempo é que no ano 69 o problema não se concentrava na Educação, Saúde, na Segurança Pública e sim nas latrinas:
Como seu filho Tito se admirasse por ter sido lançado imposto sobre as latrinas, Vespasiano deu-lhe a cheirar uma moeda e disse-lhe: – Meu filho, o dinheiro não tem cheiro” (Lelo, Porto). O Coliseu ficou conhecido como a Casa de Ouro de Nero, o verdadeiro.
ILEGALIDADES
Para se ver o Carnaval (e outros eventos), porém, seja nas arquibancadas e camarotes erguidos da rua para as calçadas, seja na própria rua, mesmo de pé – logo, em áreas de uso comum do povo, como diz a lei – esse mesmo povo, cujo direito de ver e transitar é indiscutível, tem que pagar e muito para usufruir de um bem que, pela tradição e pela legislação ao povo pertence.
Foi crendo ainda nisso que Castro Alves proclamou: “A praça! A praça é do povo como o céu é do amor. É o antro onde a liberdade cria águias em seu calor”.
O caso, porém, não é poético ou literário. O homem do povo sabe que “as ruas públicas não são bens dominiais, não se achando no patrimôno de ninguém, mas somente na jurisdição administrativa das municipalidades“, como proclamou o STF pelo voto de Laudo Camargo (RE 10.042).
Não é somente Washington de Barros Monteiro quem afirma, mas igualmente Hely Lopes Meirelles que os bens de uso comum do povo ou de uso público são os mares, rios, estradas, RUAS e praças. São bens de fruição do próprio povo. A utilização de bens públicos, ou é feita pelo povo em geral (uti universi), relativamente aos de uso comum (RUAS, praças, etc.) ou pelo poder público (repartições públicas, material de serviços, veículos, etc.). Toda a utilização contrária à destinação dos bens ou destoante de seus regulamentos é ilegítima e pode ser impedida por via administrativa ou judicial.
A ENTÃO RUA MARQUÊS DE SAPUCAÍ
Ora, ninguém contesta que a outrora Rua Marquês de Sapucaí era uma rua ou bem de uso comum do povo. Menos ainda que as arquibancadas foram erguidas com o dinheiro dos munícipes. E como foram erguidas sobre o que é bem de uso comum do povo, continua sendo o povo o titular do direito do bem comum, pois o acessório segue o destino do principal.
Sabe-se mais que a Rua em questão não foi objeto de tredestinação, o que se traduz na conclusão que não foi degradada administrativamente, o que exigiria lei expressa. Logo, é consequência lógica e legal, que lá não se pode restringir ao povo o seu de Ir e Vir, de entrar e ver o que lá se passa ou passará. Ou condicionar a pagamento o exercício dos direitos inalienáveis do povo.
Nem se invoque a possibilidade de ter ocorrido a figura da afetação, que Freitas do Amaral, professor e combativo político de Portugal, define como sendo a destinação, por lei, regulamento ou ato administrativo, de uma certa coisa para outros fins que não os que devem suportar-se conformes, em primeira linha, à natureza dessa coisa. Ele dá exemplo expressivos e adequados ao caso em tela: “é o que se dá, por exemplo, quando uma praça pública é destinada extraordinariamente para servir de mercado, ou é ocupada para a realização de uma festa tradicional, ou, ainda, quando um monumento nacional é utilizado para um concerto (em “A Utilização do Domínio Público Pelos Particulares”).
Em primeiro lugar, porque não se vislumbra que a afetação importe em pagamento, para que o povo passe ou entre e veja. Em segundo lugar porque inadmite a eternização do estado da coisa. Tudo isso que a doutrina registra reflui do artigo 66 do nosso Código Civil, que desde Janeiro de 1916, declara que “os bens públicos são: I – os de uso comum do povo, tais como os mares, rios, estradas, ruas e praças”, e assim foi mantido pelo Código Civil Brasileiro de 2003, com a mesma redação (artigo 99).
CONCLUSÃO
Portanto, o Município do Rio de Janeiro, ou mesmo o Estado, jamais poderia se apropriar e incluir no seu patrimônio um bem de uso comum do povo e cobrar, deste mesmo povo, ingresso para que o cidadão possa ir e ver o que lá se passa. Tudo isso é um verdadeiro atentado contra a legalidade e que há 30 anos (o Sambódromo foi inaugurado em 1984) tem sido aceito por todos. Ninguém poderá reclamar para assistir um espetáculo no Teatro Municipal ou no Estádio do Maracanã. São bens que integram o patrimônio da pessoa jurídica do Estado do Rio de Janeiro. Essas construções não ocorreram na rua ou na praça pública e, ao que parece, não violaram os direitos de ninguém. Assim como o particular, o poder público tem o direito de usar e usufruir o que é seu, sempre tendo em vista o interesse da coletividade. O caso do Sambódromo é diferente. Reclama uma grita do povo.
Jorge Béja é advogado no Rio de Janeiro, membro
Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros e especialista em Responsabilidade Civil. 


Oigres Martinelli Baleeiro - fevereiro 22, 2014 2:23 pm
E cobrar pelo estacionamento em vias públicas, como fazem várias prefeituras, incluída a da nossa ex-Cidade Maravilhosa, e Em São Leopoldo - RS, não vai na mesma linha? Não é absurdo igual praticado pelo poder público?



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